“Quando o luto pedir silêncio, aceite o convite.”
Helena Queiroz
“Quando o luto pedir silêncio, aceite o convite.” ¹
Quando a vida é rasgada pela perda, abre-se uma fenda temporal que corta a história em antes e depois. Somente um fenômeno grandioso poderia ser capaz de provocar essa cisão.
Como estamos inseridos na era do imediatismo, da supervalorização da superação, a ideia da paralisação pela perda é inconcebível. A gente só é preparado para vencer como se houvesse a possibilidade de percorrer os trajetos da vida sem sofrer. Desta forma, por ser imensamente dolorido, tendemos a nos desviar do trabalho de luto.
Freud usa o termo trabalho exatamente por ser penoso e depender de muita energia psíquica. O luto precisa ser elaborado aos poucos devido à fragilidade em que nos encontramos. Quando perdemos uma pessoa amada, perdemos um tanto de nós mesmos e, consequentemente, do nosso esteio.
A energia desperdiçada em se afastar da tristeza e das lembranças é vã. É no processo de rememoração que se torna possível o encontro com o perdido. Apagar reminiscências corrobora com o se apagar, pois somos constituídos por pessoas e momentos.
A virada de chave só é possível ao se despir do ressentimento e da raiva de algo ter acontecido de forma alheia à nossa vontade. Quando perdemos uma pessoa no âmbito da realidade externa, não há uma relação causal que resulte na perda dessa pessoa enquanto objeto em nós.
O mundo não para de girar enquanto estamos tentando nos reestabelecer, mas as voltas do mundo vão acomodando a dor e, ao manter viva a voz de quem perdemos, subvertemos a morte.
“Essa ausência assimilada ninguém tira mais de mim.” ²
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Texto elaborado a partir do episódio do podcast O luto e a psicanálise apresentado por Alexandre Patrício de Almeida e Filipe Pereira Vieira em setembro de 2022.
¹ - De mãos dadas: Um palhaço e um psicólogo conversam sobre a coragem de viver o luto e as belezas que nascem da despedida – Cláudio Thebas e Alexandre Coimbra do Amaral, 2022.
² - Ausência - Carlos Drummond de Andrade, no livro O corpo: Companhia das Letras, 2015.









